Brasil terá o primeiro açúcar mascavo rastreado pela tecnologia blockchain

A demanda por açúcar mascavo cresceu nos últimos anos junto com o segmento de produtos naturais
Por Redação

Foto: Magda Cruciol/ Embrapa Inovação
Inovação
Foto: Magda Cruciol/ EmbrapaInovação
Inovação

A safra 2022 começa trazendo inovações para o segmento canavieiro e para os consumidores. A partir de julho, as gôndolas das lojas e supermercados começarão a receber o primeiro açúcar mascavo com sistema de rastreabilidade baseado em blockchain, tecnologia de ponta capaz de comprovar a transparência do produto e a integridade de suas informações. Por meio de um código QR estampado na embalagem, qualquer pessoa podia verificar as informações sobre a origem e o processo de fabricação do açúcar. O açúcar mascavo é valorizado no segmento de produtos naturais e saudáveis, mas ainda sofre com casos de adulteração.

Durante três anos, uma equipe de especialistas da  Embrapa Agricultura Digital trabalhou no desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Rastreabilidade Agropecuária (Sibraar). A tecnologia foi customizada para o açúcar mascavo e validada na planta agroindustrial da  Usina Granelli  , parceira do projeto-piloto. Agora, a empresa será a primeira autorizada a comercializar o produto rastreado, que terá o selo Embrapa Tecnologia.

O sistema foi introduzido no processo produtivo em junho, iniciando com os primeiros lotes com rastreabilidade via blockchain. Pelo contrato de licenciamento, um percentual das vendas será revertido para a Embrapa na forma de royalties. O desenvolvimento do projeto contou também com o apoio da Cooperativa dos Produtores de Cana-de-Açúcar do Estado de São Paulo ( Coplacana ).

A tecnologia Sibraar permite que os dados de fabricação do produto sejam armazenados em “blocos” digitais, utilizando a tecnologia blockchain para construir uma sequência temporária e imutável dos registros e garantindo assim a integridade das informações geradas no decorrer do processo produtivo.

Cada lote de rapadura Granelli será fornecido com os dados de fabricação, variedade de cana-de-açúcar, identificação e geolocalização da propriedade rural que forneceu a matéria-prima para aquele lote, de acordo com as regras estabelecidas pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais ( LGPD, em português). Também serão fornecidas informações sobre a análise microbiológica do produto e sobre os parâmetros físicos e químicos desse açúcar, como teor de sacarose, teor de umidade e cor.

O sistema Embrapa foi pensado inicialmente para o segmento sucroenergético, mas também pode ser customizado para outras cadeias agrícolas, como a de grãos. O pesquisador  Alexandre de Castro , líder do projeto, observa que tem crescido a demanda do mercado consumidor interno e externo por alimentos mais saudáveis ​​e seguros. A rastreabilidade é fundamental para levar ao consumidor final mais informações sobre a procedência e o processo de produção para garantir a competitividade do produto brasileiro. “A adoção de ferramentas com tecnologias embarcadas como o blockchain surge como uma alternativa importante para atender esse mercado, pois permite que cada lote fabricado receba uma assinatura digital única para criar um rastro seguro para auditabilidade dos dados”, afirma.

Blockchain

O Sibraar é o primeiro software de rastreabilidade registrado no mercado nacional voltado para agroindústrias canavieiras e desenvolvido com tecnologia blockchain, que oferece ao consumidor informações por lote fabricado por meio de códigos QR disponibilizados diretamente nas embalagens.

Toda a arquitetura de agrorastreabilidade do sistema foi desenvolvida pela Embrapa e pelas equipes de armazenamento e processamento de dados, sendo que o fornecimento final das informações pela Internet ocorre nos servidores da Embrapa seguindo protocolos de segurança. Por meio de ferramentas criptográficas, cada lote de açúcar tem suas informações armazenadas em um bloco e recebe uma assinatura digital do data center da Embrapa. Lá, o software produz o encadeamento automático desses blocos, criando um histórico dos dados de fabricação ao longo do tempo. Esta sequência é então associada a um código QR que permite ao consumidor aceder à informação, necessitando apenas de um smartphone para o efeito.

“Com blockchain, a assinatura digital de cada lote do produto contém as informações codificadas de todos os lotes anteriores, em uma sequência imutável. Se houver alguma modificação no banco de dados, o código QR identificado nas embalagens dos produtos será desativado automaticamente. Esse é o diferencial da utilização de códigos de barras bidimensionais associados à tecnologia blockchain”, explica Castro. A etapa de verificação, que atesta a integridade das informações rastreadas, é distribuída, ou seja, está nas mãos dos consumidores. “Qualquer um pode verificar se o histórico daquele registro foi manipulado. Se algum dado foi modificado, o código QR não trará informações de volta. É como a nossa história de vida, se fosse possível mudar alguma coisa no passado, o seu presente como ele é seria apagado”, compara.

Diferencial competitivo

Questões relacionadas à origem e rastreabilidade dos produtos já estavam no radar da Usina Granelli. Segundo a diretora do projeto, Mariana Granelli, a possibilidade de incorporar tecnologias como blockchain foi uma oportunidade de dar total transparência e ser reconhecida pelas melhores práticas de produção e pactuadas na produção. “O mercado está ainda mais exigente, pois quanto mais transparentes formos nessa relação, acreditamos que melhor será nossa reputação junto aos consumidores”, afirma. Para este ano, ela prevê a produção piloto de quatro toneladas de açúcar mascavo com rastreabilidade. A fábrica pretende estender o uso da tecnologia para outros produtos, como açúcar demerara e álcool destilado.

Fundada há 35 anos, na região do vale do rio Piracicaba, a Usina Granelli nasceu como uma usina de cana-de-açúcar para produção industrial de cachaça. Nos anos 2000, a empresa passou a produzir também etanol e melado de cana. Sua fabricação de açúcar é mais recente, produzindo os tipos VHP (Very High Polarization), açúcar bruto destinado à exportação, demerara e mascavo. O açúcar mascavo com rastreabilidade via blockchain é a aposta da empresa para entrar no segmento de venda direta ao consumidor, por meio de supermercados, mercados especializados e plataformas de e-commerce.

“Há cinco anos a fábrica vem aprimorando o processo de fabricação, buscando parâmetros ideais de aceitação no mercado. Eles visam atender um segmento de consumidores preocupados com a saudabilidade dos alimentos e ansiosos por remunerar o açúcar com maior valor agregado. A rastreabilidade entra nesse contexto, para oferecer um alimento seguro e de qualidade”, afirma Granelli.

Um dos principais subprodutos da cana- de -açúcar até o século XIX, sendo substituído pelo açúcar branco e refinado ao longo do tempo, a demanda pelo açúcar mascavo cresceu nos últimos anos junto com o segmento de produtos naturais. Identificado por um processo de fabricação mais artesanal, por se tratar de um açúcar bruto com processamento mínimo em sua fabricação e sem aditivos químicos para branqueamento e refino, o açúcar mascavo preserva alguns nutrientes em concentrações muito superiores ao açúcar branco, como cálcio, magnésio, fósforo e potássio. Seu preço nas gôndolas chega a ser, em média, cinco vezes superior ao do açúcar branco granulado, por exemplo.

No entanto, há casos de adulteração do produto, em que o açúcar branco granulado e outras substâncias são misturados ao açúcar mascavo durante as etapas de fabricação. Isso resulta em um açúcar com características físicas semelhantes ao produto original, mas com propriedades químicas diferentes. Um dos parâmetros laboratoriais que ajudam a identificar a pureza do açúcar mascavo é o nível de polarização, que define o percentual de sacarose do produto. Esse dado é rastreado pela tecnologia da Embrapa e pode ajudar o consumidor a atestar a qualidade e adequação do produto que está comprando. A vantagem da tecnologia blockchain, aplicada em transações financeiras, é que as informações são quase invioláveis, garantindo não só a proveniência, mas também a transparência das informações da fabricação do açúcar.

*Com informações de Embrapa

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